Redação Pragmatismo
Notícias 27/Dez/2023 às 15:24 COMENTÁRIOS
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Quem é o médico acusado de matar 42 pacientes e por que ele ainda atendia pelo SUS

Publicado em 27 Dez, 2023 às 15h24

"Pacientes morriam aos poucos [...] alguns tentaram suicídio por conta de tanta dor". Mesmo após denúncias de homicídio doloso, Cremesp registrou médico acusado de matar pelo menos 42 pessoas. Em depoimentos, sobreviventes relatam cenários de horror nas mãos do profissional de saúde

médico João Batista de Couto Neto
O médico João Batista de Couto Neto

O médico cirurgião gaúcho João Batista de Couto Neto, de 47 anos, é investigado em diversos inquéritos por ter cometido dezenas de negligências médicas e feito procedimentos desnecessários que teriam provocado a morte de ao menos 42 pacientes e lesões em outros 114.

No último dia 12 de dezembro, ele foi indiciado por homicídio doloso pela Delegacia de Novo Hamburgo, com base na conclusão de três inquéritos.

Até o ano passado, quando suas redes sociais ainda eram ativas, ele exibia em seu perfil, como forma de propaganda pessoal, a marca de mais de 25 mil cirurgias realizadas em 19 anos de profissão — uma média de cerca de 1,3 mil por ano. Ele tinha mais de 15 mil seguidores no Instagram.

De acordo com a polícia de Novo Hamburgo, o médico, que só atuava na rede particular, realizava um grande número de cirurgias para aumentar os ganhos financeiros. Segundo o delegado do caso, Tarcísio Kaltbac, a quantidade de cirurgias impedia Couto Neto de cuidar corretamente das intervenções e dos pós-operatórios.

“Não conseguimos entender por que ele fazia isso com as pessoas. Às vezes, operava uma região do corpo, mas cortava outra que não tinha a ver com a cirurgia. Houve casos de pessoas que definharam no hospital, morrendo aos poucos. Isso é recorrente nos depoimentos”, disse o delegado.

“É estarrecedor o que ele fazia. Temos fotos de pessoas com a barriga aberta, apodrecendo, e ele não receitava nada, nenhum medicamento. Dizia que não era nada e que tudo ia passar. Temos relatos de tentativa de suicídio dentro do hospital, por causa de tanta dor”, acrescentou Kaltbach.

Cremesp registrou médico

Em fevereiro deste ano, o Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp) registrou o médico João Batista de Couto Neto, mesmo pesando sobre ele denúncias de homicídio doloso.

Na época do registro, o Cremesp alegou ter conhecimento da suspensão na licença de João Batista, mas realizou o registro porque se tratava de uma “restrição parcial”.

Em liberdade

Preso no dia 14 de dezembro enquanto realizava atendimentos pelo SUS, o médico foi solto no dia 19 de dezembro após um habeas corpus. No alvará de soltura, a Justiça determinou condições para que Couto conseguisse a liberdade. Além de ficar impedido de atuar como médico enquanto o processo segue em andamento, o médico também não pode tentar contato com supostas vítimas ou testemunhas, por exemplo.

No documento, a Justiça estabelece ainda que João Batista do Couto Neto só poderá entrar em hospitais ou outros estabelecimentos de saúde, se estiver na condição de paciente, enquanto o caso estiver sendo avaliado pela Justiça.

As vítimas

A professora Aida Saádeh, de 50 anos, relatou ter sido vitimada pelo cirurgião em 2016, quando o procurou para realizar uma videolaparoscopia — procedimento realizado com o auxílio de uma câmera, que é introduzida através da parede abdominal. A negligência de Couto Neto, segundo a professora, resultou em quatro tumores neuroendócrino pancreático, que só foram descobertos no ano passado. A vítima já foi até a delegacia conversar com a inspetora da Polícia Civil de Novo Hamburgo e deve prestar depoimento na próxima semana.

A cirurgia foi indicada por um antigo gastroenterologista da confiança de Aida. A indicação era que o cirurgião realizasse o procedimento para retirar e identificar a causa do surgimento dos quatro nódulos na região abdominal. No entanto, Aida relata que, apesar de o médico ter realizado cortes na região da barriga, nenhum nódulo foi retirado.

De acordo com Aida, ela pagou R$ 1 mil pelo anestesista e todo o procedimento, realizado no hospital UNIMED, foi coberto pelo plano de saúde. Após passar pela videolaparoscopia, a professora realizou novos exames, que constataram que nenhum dos nódulos haviam sido retirados. A descoberta tardia, já em estágio de metástase, aconteceu pela característica da doença, de ser assintomática.

“A grande dúvida que eu tenho é o que ele fez comigo, porque eu fui anestesiada, tenho cicatrizes, mas não foi retirado nada de mim. Exames posteriores provam isso. Inclusive não foi feita a biópsia para saber do que se tratavam os nódulos. Depois, quando o questionei, ele disse que eu tinha apenas camadas de endométrio e um nódulo dentro do pâncreas, quando, na verdade, eu ainda estava com os quatro caroços e nenhum dentro do pâncreas”.

Em cirurgias realizadas este ano, a professora tirou parte do intestino e estômago, e os quatro nódulos. Na última, ela ficou 32 dias internada, contraiu infecção hospitalar e precisou fazer hemodiálise. Já sofrendo de transtorno bipolar, Aida teve ainda que lidar com a depressão acarretada pela negligência.

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