Viúva luta para inocentar homem preso há 42 anos acusado de matar seu marido
Viúva luta para inocentar homem preso em solitária há 42 anos por morte de seu marido
Mais de quatro décadas depois da morte de seu marido, a americana Leontine Rogers se uniu a uma campanha pela libertação do homem acusado e condenado pelo crime.
Teenie, como é chamada, diz estar convencida de que Albert Woodfox, condenado pelo assassinato e preso há 42 anos em regime de isolamento, é inocente. Ele foi acusado do crime ao lado de Herman Wallace, morto no ano passado.
“Eu vi e li todas as provas e ninguém pode me convencer do contrário. Eles são inocentes”, diz Teenie, que participa dos esforços da Anistia Internacional pela libertação de Woodfox.
“Não há nada que prove que Herman e Albert são culpados”, afirma a viúva.
Seu marido, o guarda penitenciário Brent Miller, foi morto a facadas em 1972, aos 23 anos, na Penitenciária Estadual de Louisiana, conhecida como Angola, onde trabalhava.
Na época, Woodfox cumpria pena por roubo à mão armada. Ao lado de Wallace, que também cumpria pena no local, e outros detentos, Woodfox organizava uma célula do movimento negro revolucionário Panteras Negras em Angola – considerada uma das prisões mais brutais dos Estados Unidos.
Os dois foram condenados pelo assassinato de Miller e, ao lado de um terceiro detento, Robert King, ficaram conhecidos como “Os três de Angola”, por terem sido colocados em confinamento solitário, cada um restrito a uma cela de aproximadamente 2×3 metros por 23 horas diárias, sem contato com outros presos.
O caso chamou a atenção de grupos de defesa dos direitos humanos, que afirmam que os três – negros – foram vítimas de falhas no julgamento e discriminação e sujeitos a condições desumanas, pelo tempo passado na solitária.
“As graves falhas no caso não foram reparadas. Apesar de tribunais terem derrubado sua condenação, Woodfox permanece na prisão”, disse a ativista Tessa Murphy, da Anistia Internacional.
Woodfox foi condenado em 1973 por homicídio em segundo grau e sentenciado à prisão perpétua.
“Ele foi condenado por um júri composto só de brancos, em um julgamento de poucas horas”, diz Murphy.
Entre as falhas apontadas pelos defensores de Woodfox estão o fato de a principal testemunha, um estuprador que cumpria pena em Angola na época, ter recebido benefícios do então diretor da prisão em troca de seu depoimento e, posteriormente, ter sido perdoado e libertado.
Outro preso que testemunhou ter visto Woodfox e Wallace saindo da porta do local do crime, era cego. Uma terceira testemunha era esquizofrênica e estava sob o efeito de medicamentos na época.
Além disso, não houve provas físicas ligando Woodfox ou Wallace ao crime.
Novo julgamento
Woodfox teve sua condenação derrubada em 1992, com a justificativa de que tinha recebido aconselhamento legal ineficiente.
Em 1998, ele foi julgado novamente, e novamente condenado. Neste julgamento, as principais testemunhas já estavam mortas, mas tiveram seus depoimentos lidos no tribunal pela acusação, sem objeção dos advogados de defesa.
Em 2008, um juiz federal ordenou que essa segunda condenação também fosse derrubada e que Woodfox fosse libertado.
Mas o Estado da Louisiana apelou contra essa decisão, e o caso está agora em um tribunal federal de apelações, o 5º US Circuit Court of Appeals.
O procurador-geral da Louisiana, Jamed “Buddy” Caldwell, rebate a afirmação de que Woodfox não teve acesso a aconselhamento legal eficiente nos julgamentos anteriores.
Para Caldwell, os advogados de Woodfox não foram ineficientes, eles simplesmente não tiveram sucesso.
Na época da apelação, Caldwell declarou que Woodfox é um homem “muito perigoso” e lembrou que havia três testemunhas oculares do crime. Disse ainda que, se houvesse algo errado com o processo, seria o primeiro a deixar que Woodfox e Wallace fossem libertados.
Panteras Negras
Dos “Três de Angola”, Woodfox é o único que permanece na prisão. King foi libertado em 2001, após 29 anos em confinamento solitário e depois de ter sua condenação derrubada.
Wallace, condenado em 1974 em um julgamento separado do de Woodfox, foi libertado no ano passado, aos 71 anos de idade, depois que um tribunal federal decidiu que seu julgamento havia sido injusto.
Ele morrreu de câncer no fígado apenas três dias após sua libertação, depois de passar 41 anos em confinamento solitário.
Muitos acreditam que o fato de os três integrarem os Panteras Negras teve influência na decisão de mantê-los na solitária por tanto tempo.
“Acho que o único motivo para manter Woodfox na solitária é a punição por participar dos Panteras Negras”, disse Jules Lobel, professor de Direito da Universidade de Pittsburgh.
“Não acho que exista nenhuma justificativa relacionada a segurança”, afirmou Lobel, que preside o Center for Constitutional Rights, organização de defesa dos direitos constitucionais com sede em Nova York.
O procurador-geral da Louisiana nega esse tipo de alegação. Caldwell já afirmou, inclusive, que o tipo de confinamento a que os três foram submetidos não pode ser caracterizado como “solitário” já que, apesar de ficarem sozinhos em suas celas, eles conseguiriam se comunicar com outros prisioneiros.
Para Lobel, a natureza do sistema de Justiça Criminal nos Estados Unidos, baseado em classe e raça, tem influência no grande número de julgamentos com falhas no país.
“Há muitos inocentes nas prisões dos Estados Unidos”, afirma.
“Se você é rico e pode contratar um bom advogado, tem muito mais chance de não ser condenado. Mas se é pobre e não tem acesso a uma boa defesa, acaba atropelado (pelo sistema).”
Justiça
Segundo a Anistia Internacional, Woodfox é atualmente a pessoa ainda presa em confinamento solitário a ficar mais tempo nessa condição.
“Saber que eles estiveram lá (na solitária) por todos esses anos simplesmente parte meu coração”, diz a viúva do agente penitenciário morto.
“Passar esse tempo todo, especialmente sabendo que você não fez nada para merecer isso. Não consigo nem imaginar”, afirma Teenie.
Ela diz pensar que o Estado continua insistindo em manter Woodfox na prisão porque “precisam culpar alguém, e acham que estão fazendo Justiça”.
No entanto, diz acreditar que ela e sua família não receberam Justiça, já que crê que os verdadeiros assassinos de seu marido não foram punidos.
“Na verdade, é uma injustiça o que estão fazendo. Acho que precisa acabar”, diz.
BBC