Fantástico: O desserviço praticado contra a mulher
Repórteres e apresentadores tentaram dar umtom de jornalismo investigativo sério à reportagem que, em resumo, ésensacionalismo puro. Caso a emissora realmente tivesse o interesse deinformar, investigaria as razões para a realidade encontrada nasclínicas. Em nenhum momento, a reportagem focou nas mulheres einvestigou seus motivos para abortar. Idade? Saúde? Profissão?Problemas emocionais? Condição social? Situações conjugais?
Imaginea reação de mulheres brasileiras – que são forçadas a procurar serviçosclandestinos – sendo informadas sobre a experiência de mulheres empaíses, como a Inglaterra, por exemplo. O governo dá assistência médicae psicológica gratuita à mulher, respeitando seu direito de escolha.Nem mesmo o parceiro pode interferir.
Claro que a Globo não sedeu ao trabalho de citar exemplos de países onde o aborto é legalinformando os motivos para tal posicionamento e como isso repercutesocialmente. A emissora esqueceu-se de dizer que o aborto é umprocedimento médico 100% seguro dependendo do tempo de gestação.
“A Globo ataca novamente”
Ascentenas de clínicas de luxo que atendem classes média e alta foramignoradas. Talvez porque as mulheres tratadas nelas não engrossam asestatísticas do SUS de pacientes atendidas com complicações pós-aborto.Estes casos são segredos divididos com melhores amigos ou parentespróximos.
Infelizmente, só se conhece um lado da moeda. Édifícil saber a porcentagem de mulheres aos 40 anos que conseguiramcompletar os estudos ou seguir carreira profissional depois daoportunidade de interromper uma gravidez com assistência médicaadequada. Seria interessante saber também quantas clínicas deassistência à mulher que necessita aborto poderiam ser construídas emantidas com o dinheiro usado pelo Sistema Único de Saúde (SUS) parasocorrer pacientes com complicações pós-aborto.
Vale a penaquestionar. Por que o aborto é proibido no Brasil? Seria porque oCódigo Penal de 1940 criminaliza o procedimento médico e, 70 anosdepois, os artigos que legislam aborto ainda não foram revisitadosefetivamente? Ou, talvez, poque a proibição esteja ligada a questõesreligiosas?
Enquanto a emissora veicula desserviço e os projetosde leis a favor da legalização do aborto tramitam de comissão emcomissão no Senado e na Câmara, a sociedade brasileira continua comopiniões infundadas sobre o assunto. A abertura de inquéritos parainvestigação das clínicas e a possível punição dos envolvidos não vãoanular o problema. Uma imensa campanha deve ser iniciada no Brasil parainformar sobre aborto e reforçar o uso de métodos contraceptivos. Nãopodemos ter pessoas pensando em aborto como remédio para gripe, caso otratamento seja legalizado futuramente.
Lamentavelmente, ostelespectadores da Globo daquela noite dificilmente terão acesso aoartigo da jornalista Teresinha Vicente, da Ciranda da InformaçãoIndependente, em resposta à reportagem do Fantástico. Intitulado “A Globo ataca novamente“, o texto foi publicado no site da Caros Amigose da própria Ciranda. Ele protesta contra o pobre jornalismo praticadopela emissora e enfatiza a urgência do respeito à liberdade de escolhada mulher.
Texto de Fabiana Reis