Redação Pragmatismo
Terrorismo 13/Mar/2015 às 12:30 COMENTÁRIOS
Terrorismo

O Estado Islâmico, os Estados Unidos e as perguntas certas

Publicado em 13 Mar, 2015 às 12h30
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Interrogações sobre Estado Islâmico e EUA (Imagem: Pragmatismo Político)

Bruno Mariotto Jubran, Ricardo Fagundes Leães e Robson Coelho Cardoch Valdez, Pragmatismo Político

O filósofo esloveno Slavoj Žižek costuma salientar que, ao contrário do que normalmente se pensa, o dever da filosofia é preocupar-se mais em fazer as perguntas certas e menos em prover respostas. Com isso, Žižek não pretende afirmar que haja questionamentos equivocados, mas sim que frequentemente nos deparamos com situações em que deixamos de nos indagar sobre temas que não poderiam ficar à margem da discussão.

No tocante ao Estado Islâmico do Iraque e da Síria (conhecido por seu acrônimo em inglês, ISIS), por exemplo, encontramo-nos em uma circunstância tal qual a descrita por Žižek, na medida em que as interrogações que são feitas a esse respeito não dão conta da extensão do problema. Via de regra, debate-se o porquê de um grupo ser capaz de praticar torturas e assassinatos das maneiras mais ignominiosas que se pode imaginar, conduta que se aplica a todos que não estiverem em conformidade com sua interpretação do Islã: não só infiéis (todos os que não partilham da fé islâmica), mas também – e principalmente – muçulmanos xiitas, além de outras correntes minoritárias da religião de Maomé.

A despeito da sinceridade e da necessidade de se levantarem essas questões, não é aí que localizaremos as respostas para impedir a continuação dessa barbárie. Isso porque atrocidades do tipo são cotidianamente cometidas em países como a Arábia Saudita (cujas lideranças compactuam com a visão purista do Islã que o ISIS advoga) e não são raridade em outras conjunturas históricas.

Dessa forma, as perguntas decisivas a respeito da ascensão do ISIS seguem afastadas dos debates sobre o assunto: por que o ISIS chegou ao poder? Como conseguiu se expandir? De que modo se estabeleceu nos territórios que atualmente controla? Como se financia? Como e quem os armou? Como enfrentá-lo, derrotá-lo e assegurar que não possa retornar no futuro?

Com efeito, a raiz desses problemas se situa na maneira encontrada pelos Estados Unidos para combater seus inimigos no Oriente Médio. Afinal, ao invadir o Iraque e deixar o país acéfalo, Washington abriu um vácuo de poder em grande parte do território iraquiano, permitindo a proliferação de grupos interessados em se apossar politicamente desses lugares. Foi justamente nesse contexto que surgiu o ISIS, então sob comando de Abu Al-Zarqawi, jihadista jordaniano ligado à al-Qaeda. O movimento logrou expandir-se numérica e territorialmente nos anos subsequentes, uma vez que o governo iraquiano estabelecido pelos EUA privilegiava a parcela xiita da população. Esse panorama se acentuou depois de 2011, quando as tropas norte-americanas saíram do Iraque, exacerbando a falta de controle estatal sobre o país.

Quando ocuparam o Iraque, os Estados Unidos prometeram pôr um termo no “islamofascismo”, alegando uma vinculação entre Saddam Hussein e a al-Qaeda. Essa acusação era estapafúrdia, pois o regime iraquiano era secular e pan-arabista, rejeitando qualquer forma de islamismo político. Ao final, o governo norte-americano não só descumpriu sua promessa como ainda montou o cenário para a emergência do ISIS.

Em seguida, com a eclosão da Guerra Civil Síria, a fragilização do governo de Bashar al-Assad (cujo regime é análogo ao de Saddam) permitiu que o ISIS se apoderasse de partes do território sírio, alargando sua esfera de influência. Essa conquista teve importantes repercussões militares e econômicas para o grupo jihadista, visto que seus recursos bélicos foram quase todos obtidos como espólio de guerra das Forças Armadas do Iraque e da Síria, e sua principal fonte de receitas é a exploração do petróleo iraquiano, que é refinado em solo sírio.

Nesse momento, caso a prioridade seja mesmo derrotar o ISIS, os Estados Unidos necessitam acercar-se do Irã, que já manifestou reiteradas vezes sua contrariedade em relação a essa organização. Do mesmo modo, têm de reavaliar sua posição no que diz respeito ao governo sírio, maior aliado iraniano na região. Por mais que a vitória de Assad não constitua o cenário ideal – dado seu histórico de desrespeito aos direitos humanos –, sua derrota seria ainda pior, pois acarretaria a pulverização do poder na Síria – tal como ocorreu no Iraque – deixando ainda mais espaço para o ISIS. Finalmente, precisam reconsiderar sua parceria com a Arábia Saudita, um dos Estados mais repressivos da atualidade e que é acusado de financiar organizações terroristas ao redor do mundo.

Ao tratar do ISIS, portanto, não basta analisar as razões psicológicas que o motivam a cometer atrocidades. A história mostra que sempre houve e sempre haverá quem esteja disposto a cometê-las. É imperativo, porém, ponderar quais são as verdadeiras causas de seu êxito, bem como as alternativas para debelá-lo.

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