O que somos?
André Falcão*
Esse era um uruguaio jovem proprietário de um “hotel boutique”, em Colônia de Sacramento: atendimento personalizado, arquitetura e ambientação que se destacam por características ora bucólicas, ora vanguardistas, modernos, mas sem ser futuristas, charmosos e muito agradáveis; invariavelmente belos. Culto, demonstrava conhecer satisfatória e então para mim surpreendentemente a história e a situação econômica e política do seu país e do mundo. Cuidadosamente, criticou a campanha reacionária dos grandes grupos midiáticos no Brasil, e lamentou a legião de brasileiros que, por eles manipulados, não conseguiam enxergar os avanços obtidos com os governos Lula e Dilma. E vaticinou, antes que eu o dissesse: esse é o resultado de uma ditadura que não foi cabalmente derrotada, como a que vocês enfrentaram por mais de vinte anos. Avança sobre a comunicação e, pior, sobre a educação escolar, formando uma geração de bacharéis e pós-graduados que nada conhecem de História, com “H” maiúsculo, frisou. Quando me reportei à retomada das conversações entre CUBA e os EUA, então recém-iniciada, com o semblante desanuviado falou-nos da esperança de que a Ilha possa finalmente livrar-se daquele jugo terrível, insana e cruelmente imposto pela potência econômica norte-americana. Era um jovem capitalista uruguaio que me dizia. Os adjetivos foram dele.
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Esse outro era uma espécie de faz-tudo de um pequeno e agradável hotel em Punta Del Este, rico balneário da elite branca uruguaia. Falava fluentemente três línguas além da sua; já residira em algumas partes do mundo. Tinha horror às ditaduras que se estabeleceram em nosso continente. Sobre CUBA e EUA, não nos passou impressão diferente daquela de seu conterrâneo, acima sucintamente referida, mas destacou a fibra e o orgulho do povo cubano por seu país e pela intransigente defesa do socialismo. Gostava muito do Brasil e torcia para que o governo continuasse logrando êxito na sua política até agora exitosa de redução das desigualdades sociais e combate à corrupção. Sobre a classe média do Fora Dilma, vaticinou: aprenderam o que a ditadura que os subjugou quis que fosse aprendida. Por quê?, perguntei. Porque não foi categoricamente derrotada.
Diversos testemunhos semelhantes ouvi dos hermanos uruguaios com quem tive o prazer de conversar: de empresários bem sucedidos a estudantes, de professor universitário a garçons. Todos latino-americanos como nós. Como nós?
*André Falcão é advogado e autor do Blog do André Falcão. Escreve semanalmente para Pragmatismo Político