Nicolas Chernavsky
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Política 13/Mai/2015 às 17:46 COMENTÁRIOS
Política

O trauma por trás do complexo em defender a reeleição

Nicolas Chernavsky Nicolas Chernavsky
Publicado em 13 Mai, 2015 às 17h46

A aprovação da emenda da reeleição no primeiro governo FHC, pela forma como foi feita, gerou um repúdio tão grande nos setores mais progressistas da sociedade, que agora, quando o conservadorismo quer acabar com a reeleição por medo de Lula, o progressismo precisa voltar no tempo e conseguir diferenciar a ideia da possibilidade de reeleição, da forma como foi aprovada em 1997

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Imagem: Pragmatismo Político

Nicolas Chernavsky*

A permissão da candidatura à reeleição dos governantes através do voto popular democrático tem predominância no mundo, mas há também países que não a permitem. Assim, muitos regimes presidencialistas permitem a reeleição, mas alguns não. Dos que permitem, muitos a limitam a uma reeleição, mas alguns não limitam o número de reeleições. Já os regimes parlamentaristas, em geral não têm limites à reeleição do primeiro-ministro. No Brasil, desde 1997, é permitida uma reeleição para os governantes. A questão é que independentemente da conveniência ou não da reeleição em termos profundos (estruturais, de longo prazo e de princípios da democracia), a reeleição também tem efeitos conjunturais (de curto prazo ou específicos para um governante ou partido político).

No Brasil, os efeitos conjunturais da reeleição na época da sua instituição, em 1997, foram traumáticos. Mudou-se fortemente a regra do jogo a cerca de um ano das eleições presidenciais de 1998, permitindo ao presidente em exercício, Fernando Henrique Cardoso, disputar essa eleição. Esse efeito conjuntural deixou uma impressão muito forte, quase inegável, de que a reeleição não foi aprovada por uma questão estrutural, mas conjuntural. Isso fez com que a sociedade brasileira, na época de sua aprovação no parlamento, não tenha discutido o assunto de forma estrutural, com o tempo e a profundidade necessárias. Assim, o tema sempre ficou superficialmente compreendido, o que é um terreno fértil para novas medidas apenas conjunturais em relação à reeleição. Esse é o contexto do atual desespero conservador para acabar com a reeleição, uma vez que há considerável probabilidade de Lula vir a ser candidato a presidente em 2018.

Dessa forma, as nossas instituições democráticas precisam parar de agir conjunturalmente em relação à reeleição, e para isso, temos que discutir aprofundadamente a questão, à luz do longo prazo e do aprofundamento da democracia. O problema é que a forma como se aprovou a reeleição em 1997 gerou traumas no ambiente político que dificultam esse debate. O setor mais progressista da política brasileira tem uma certa vergonha de defender a possibilidade de reeleição porque automaticamente associa a reeleição no Brasil aos episódios de 1997. Por isso, não há solução a não ser voltar no tempo (obviamente em nossas mentes, para os fãs de ficção científica, entre os quais me incluo) e reanalisando aquele episódio, conseguir separar os efeitos estruturais da reeleição das razões conjunturais pela qual foi instituída.

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De fato, parece bastante provável que, fundamentalmente, a motivação do governo FHC para impulsionar a aprovação da reeleição em 1997 era que o presidente pudesse se recandidatar em 1998. É possível até que Fernando Henrique Cardoso ou membros da coalizão conservadora que governava o país na época fossem estruturalmente favoráveis à reeleição, mas a força política necessária para o processo de aprovação não veio em sua maior parte dessas considerações. Entretanto, o progressismo não precisa se pautar pelo conservadorismo, ou seja, não é porque o conservadorismo fez algo por motivos conjunturais que o progressismo deve considerar a medida automaticamente errada, desde que essa medida tenha motivos estruturais que a sustentem. No caso da reeleição, essa superficialidade de discussão do conservadorismo está fazendo com que ele, o conservadorismo, novamente se mova por motivos conjunturais para acabar com a reeleição, por medo de que Lula possa se reeleger em 2022 se for eleito presidente em 2018. Está na hora do progressismo mostrar por que é progressismo e agir diferente. As razões estruturais e profundas devem nortear o debate progressista sobre a reeleição. Se o conservadorismo quiser acabar com a reeleição, que o discuta, vamos lá: não é cercear a democracia impedir o povo de escolher alguém para governá-lo, ainda mais se esse alguém fez um governo bem avaliado? Ou por outro lado, é melhor para a democracia impedir essa possibilidade para que o ocupante do cargo não se utilize do fato de influir na própria organização das eleições para se reeleger? Será que uma solução não seria desvincular a organização das eleições dos poderes reeleitos naquele momento? Mas como fazer isso? Na Bolívia, por exemplo, os órgãos eleitorais são uma espécie de “quarto poder”. Ou seja, há várias opções de análise. O que não dá é esse costume conservador de discutir as coisas superficialmente, dando assim vazão a interesses arcaicos e obscuros. Progressistas, vamos encarar o trauma de 1997 e, sendo contra ou a favor da reeleição, fazer uma discussão de alto nível.

*Nicolas Chernavsky é jornalista formado pela Universidade de São Paulo (USP), editor do CulturaPolítica.info e colaborador do Pragmatismo Político

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