Asilo para Assange: Reino Unido ameaça Equador com medida temerária
Chanceler do Equador diz que recebeu ameaça do Reino Unido sobre caso Assange. Segundo Ricardo Patiño, Londres teria cogitado invadir a embaixada caso jornalista receba asilo
O governo do Equador anunciou oficialmente na manhã desta quinta-feira, por meio de um comunicado do ministro de Relações Exteriores, Ricardo Patiño, que aceitou o pedido de asilo apresentado pelo fundador do Wikileaks, Julian Assange. Além disso, reafirmou que as ameaças do governo britânico de invadir a embaixada equatoriana em Londres para prender o ativista australiano são inaceitáveis.
O ministro das Relações Exteriores do Equador, Ricardo Patiño, anunciou nesta quinta-feira (16) que o país aceitou o pedido de asilo apresentado há cerca de dois meses pelo fundador do Wikileaks, Julian Assange.
“Há sérios indícios de retaliação por parte de um país ou países que se sentem afetados pela divulgação de informação confidencial [pelo site WikiLeaks], que pode pôr em causa a integridade de Julian Assange ou a sua vida”, disse o responsável pela diplomacia equatoriana.
Patiño afirmou que se fosse extraditado para os Estados Unidos, na sequência da extradição para a Suécia, Assange não teria um julgamento justo e poderia inclusive enfrentar a pena capital. “O sr. Assange não teria um julgamento justo nos EUA e não é inverossímil que lhe fosse aplicado um tratamento cruel e degradante”, disse ainda o ministro.
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Patiño reafirmou que as ameaças do governo britânico de invadir a embaixada para prender o australiano são inaceitáveis e explicou que o Equador convocou os diferentes organismos regionais para estudar o que qualificou de ameaça. “Em caso algum se podem aceitar esta chantagem, estas ameaças”, enfatizou.
Londres já tinha comunicado que a concessão do asilo não muda nada, e que o governo britânico tem a obrigação de extraditar Assange para a Suécia. Por outro lado, no documento ameaçador entregue às autoridades equatorianas, o governo britânico afirmou que não daria salvo-conduto ao australiano para sair da embaixada, o que faz prever que a sua permanência no prédio londrino, que à luz da lei internacional é considerado território do Equador, pode eternizar-se.
Na manhã desta quinta-feira, houve incidentes com ativistas britânicos da Wikileaks, que foram retirados de volta da embaixada, quando a polícia reforçou o cerco ao prédio.
As ameaças do governo britânico
A ameaça apresentada pelo governo do Reino Unido de invadir a embaixada do Equador em Londres para prender o fundador da Wikileaks, Julian Assange, é oficial e consta de uma carta entregue ao Ministério dos Negócios Estrangeiros em Quito. “Recebemos a ameaça expressa e por escrito”, afirmou o ministro dos Negócios Estrangeiros do Equador, Ricardo Patiño, numa conferência de imprensa realizada na noite de quarta-feira, acrescentando considerar esta atitude imprópria de um país democrático, civilizado e que respeita o Direito.
“Se as medidas anunciadas na comunicação oficial britânica se materializarem, serão interpretadas pelo Equador como um ato hostil e intolerável e também um ataque à nossa soberania, que exigirá uma resposta com grande força diplomática”, disse Patiño, acrescentando que uma ação como essa seria um flagrante desrespeito da convenção de Viena sobre as relações diplomáticas e das regras da lei internacional nos últimos quatro séculos.
“Seria um precedente perigoso porque abriria a porta à violação de embaixadas como um espaço soberano declarado”, afirmou o responsável pela diplomacia equatoriana. Sob a lei internacional, as instalações diplomáticas são consideradas território da nação estrangeira.
A decisão do governo do Equador sobre o pedido de asilo apresentado por Assange ao refugiar-se na embaixada será conhecida nesta quinta-feira.
Por seu lado, o presidente da Assembleia Nacional do Equador, Fernando Codero Cueva, convocou uma sessão extraordinária do parlamento para tomar posição sobre a comunicação britânica. No portal da Assembleia, Cueva recorda que “a Constituição da República do seu país condena a ingerência dos Estados nos assuntos internos de outros Estados e qualquer forma de intervenção, seja incursão armada, agressão, ocupação ou bloqueio económico ou militar”. E conclui: “Com base nos princípios constitucionais, Fernando Cordero Cueva, titular da legislatura, qualificou este facto como uma intolerável ameaça britânica”.
O portal da Assembleia disponibiliza um resumo da carta britânica, onde se afirma, entre outras coisas, que, diante da possibilidade de o presidente Rafael Correa conceder asilo a Assange, as autoridades britânicas negarão qualquer salvo-conduto para permitir a saída do australiano da embaixada. Mas as passagens mais significativas da carta são as que se referem a uma possível invasão da embaixada:
• Devemos reiterar que consideramos o uso contínuo de instalações diplomáticas desta maneira incompatível com a Convenção de Viena e insustentável, e que já deixamos claro as sérias implicações para as nossas relações diplomáticas.
• Devem estar conscientes de que há uma base legal no Reino Unido – a Lei sobre Instalações Diplomáticas e Consulares de 1987 (Diplomatic and Consular Premises Act 1987) – que nos permitiria tomar ações para prender o sr. Assange mas instalações atuais da embaixada.
• Sinceramente esperamos não ter de chegar a este ponto, mas se os senhores não podem resolver o assunto da presença do sr. Assange nas instalações, estará o caminho aberto para nós.”
“Não somos uma colônia britânica”
O ministro dos Negócios Estrangeiros do Equador reafirmou que “a entrada não autorizada na embaixada do Equador seria uma violação flagrante da Convenção de Viena”. E sublinhou: “Não somos uma colônia britânica. Esses tempos são passado.”
Julian Assange, fundador do site Wikileaks pediu asilo à embaixada do Equador em Junho para evitar a extradição para a Suécia, onde teria de responder como testemunha a um processo de agressão e violação sexual, de que não foi ainda acusado formalmente. O australiano de 41 anos, que nega os crimes, quer evitar a extradição para a Suécia por considerar que esta seria apenas um pretexto para depois o extraditar para os Estados Unidos.
Em reação às declarações de Patiño, o governo britânico disse que apenas “chamou a atenção do Equador sobre as disposições da legislação britânica, entre elas as garantias sobre os direitos humanos” nos processos de extradição no país e o “status legal das sedes diplomáticas”.
Num comunicado emitido já nesta quinta-feira, a Wikileaks condenou a ameaça britânica. “Uma ameaça desta natureza é um ato hostil e extremo, que não é proporcional às circunstâncias, e é um ataque sem precedentes aos direitos dos cidadãos que procuram asilo por todo o mundo”, afirma a organização.
Carta Maior