E-mail ameaçador revela que estudante da UFRJ morreu por ser gay e negro
"Vamos começar por um aluno que se diz minoria por ser gay; que gosta de fumar maconha; que apoia o aborto e odeia Bolsonaro [...] Nenhuma vez o socialismo deu certo", diz trecho de e-mail. Delegado que investiga o caso vê motivação homofóbica em assassinato de Diego: "Era homossexual e vinha recebendo ameaças homofóbicas e racistas"
Um dos emails com as ameaças a alunos bolsistas da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) está circulando nas redes sociais e revela o tom de grupos conservadores que atuam dentro da instituição.
O que chama a atenção é um trecho que diz que as ameaças serão cumpridas começando “por um certo aluno, que se diz minoria e oprimido por ser homossexual”. Alguns acreditam que o alvo da ameaça era o estudante de Arquitetura Diego Vieira Machado, 24 anos, encontrado morto neste sábado.
“Vamos começar por um certo aluno que se diz minoria e oprimido por ser homossexual, que gosta de fumar maconha e outras coisitas mais (cocaína, chá de amanita) às vezes com o dinheiro da bolsa ou da família opressora. (…) Que gosta de mandar e receber nudes de seus amiguinhos pederastas […]”, diz trecho de um e-mail.
Em outro e-mail, as ameaças continuam. “Nenhuma vez o socialismo deu certo e não é com vocês que isso vai dar, aguardem os próximos capítulos. (…) Como descobrimos vocês? Conhecemos vocês, estamos nos CAs (Centros Acadêmicos), DCEs (Diretórios Centrais Estudantis) e instituições de ensino e pesquisa. (…) Estamos infiltrados!”. O texto é assinado pela “Juventude Revolucionária Liberal Brasileira e informa ainda: “Nós somos muitos, somos a maioria, somos unidos e somos anônimos!”
Segundo o estudante de Comunicação Pedro Paiva, diretor do centro acadêmico do curso, grupos fascistas e conservadores atuam há algum tempo na universidade e ameaçam alunos, professores e outros servidores. “Eles fazem comentários homofóbicos. Os banheiros são pichados com frases como ‘morte aos homossexuais, morte aos gays’. No banheiro da ECO (Escola de Comunicação) foi pichado “Morte aos gays da UFRJ”, disse.
O delegado Fábio Cardoso, que atua na Divisão de Homicídios do Rio de Janeiro e é responsável por investigar a morte do estudante Diego Vieira Machado, afirmou que o crime pode ter motivação homofóbica.
“Diego era homossexual e vinha recebendo ameaças homofóbicas e racistas nos últimos dias. Então há uma linha forte de investigação que aponta que a motivação desse crime tenha sido homofobia”, afirmou.
Diego, que estudava Letras na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e morava no alojamento da instituição, tinha marcas de espancamento.
O corpo do estudante foi encontrado no fim da tarde de sábado (2). Como o corpo estava nu da cintura para baixo, a polícia investiga também se ele foi alvo de violência sexual.
“As equipes da DH que estiveram no local, verificaram que ele era homossexual e vinha recebendo ameaças homofóbicas e racistas. O corpo foi encontrado sem calça, apenas com camisa. Ele teria sido abordado no campus e agredido na cabeça. Está sendo feita a necropsia. É um crime covarde e cruel, que precisa de uma resposta rápida.”, explicou Cardoso.
O deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ) se manifestou pelo Facebook.
“A mensagem dizia claramente “sabemos quem são vocês” e “queremos vocês fora daqui”. Havia também uma ameaça velada a um estudante, que se suspeita fortemente que seja Diego”, escreveu o deputado.
Amigos de Diego reforçam a tese:
“Ele era teimoso, muito briguento. Mas só reagia aos ataques raciais e homofóbicos que sofria. Eu testemunhei algumas brigas. Ele era uma pessoa boa”, contou a estudante de Comunicação Pérola Gonçalves, de 22 anos, amiga de Machado.
“Acordei hoje com meu filho chorando por conta dessa notícia horrível: um aluno da UFRJ, morador do alojamento, foi brutalmente assassinado dentro do campus por causa da sua orientação sexual. Ele foi morto à pauladas, ontem, dentro da Cidade Universitária, onde trabalhamos, estudamos e várias pessoas moram. Estou triste e com muito medo. Meu filho é gay, seus amigos são gays e circulam como deve ser, pelo campus do Fundão, todos os dias”, escreveu a professora de Letras Georgina Martins.
“Diego, negro, gay, nortista, morador do alojamento, assassinado com requintes de crueldade na maior universidade do país, a UFRJ, no campus da Escola de Belas Artes, deu adeus a todos os seus sonhos de maneira precoce, compulsória, violenta e desumana”, lamentou uma estudante.
A reitoria da UFRJ, que lamentou a morte do jovem em nota oficial. “A reitoria se junta aos amigos e familiares do estudante neste momento de dor e informa que acompanhará de perto as investigações sobre o caso junto às autoridades policiais”, diz o texto.
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