Os bastidores do TSE para livrar Michel Temer da cassação
Processo que pode cassar Michel Temer tramita no TSE, Tribunal presidido por Gilmar Mendes. Neste momento, nos bastidores, há intensa movimentação para absolver o ex-vice de Dilma. Separação dos processos é o primeiro passo. Saiba mais
Patrícia Farmann, Jornal GGN
Antes da saída de Maria Thereza de Assis Moura do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a ministra, que era responsável por relatar os processos de cassação da chapa de Dilma Rousseff e Michel Temer, tentava garantir que os próximos meses não trariam surpresas às investigações das contas de campanhas de 2014.
Para isso, não só se assegurou de levantar as testemunhas que participariam das investigações a seguir, como também arrolou a campanha do senador Aécio Neves (PSDB) nas apurações do Tribunal.
Isso porque, como corregedora da Justiça Eleitoral no TSE, Maria Thereza relatou as contas do tucano no ano seguinte ao pleito de 2014 e detectou 15 irregularidades. E, antes que deixasse o posto de integrante do Tribunal, respondeu ao pedido de Gilmar Mendes de investigar o PT – em um dos seus primeiros movimentos como presidente da Corte – com outra demanda: se válidos os argumentos de Gilmar, o PSDB, PMDB e PP também deveriam ser investigados.
Gilmar Mendes queria garantir que o impeachment de Dilma não apenas representaria o afastamento da petista do posto maior no Planalto, como também todos os membros do partido carregariam a pena da eliminação do registro da sigla no TSE – o fim do PT da política nacional.
Mas o pedido de cassação do PT por Gilmar ocupava outra estratégia, aparentemente menor do que o fim em si do partido, mas com impacto de governabilidade maior, possível de visualizar apenas nos meses seguintes: a absolvição de Michel Temer. Para isso, seria necessário, primeiro, a separação dos processos.
Quando foram dados os primeiros sinais de costura nos bastidores do TSE, com o objetivo de afastar Temer dos quatro processos que tramitam sobre as contas de campanha da chapa com a ex-presidente Dilma, já estavam contabilizados Gilmar, Luiz Fux, Dias Toffoli e Henrique Neves como favoráveis à divisão das ações.
Posicionavam-se contra a medida a então relatora Maria Thereza de Assis Moura, Luciana Lóssio e o atual relator Herman Benjamin. Além de Maria Thereza que teve que deixar o posto já neste ano, os mandatos de Luciana e Herman também expiram em 2017.
Neste cenário de incertezas, Gilmar Mendes atuou para definir a separação dos autos. Começando pela decisão tomada na primeira semana de agosto, determinando a abertura de processo que retirasse o registro do PT. Ainda que se tratando de ações diferentes, a investigação guardava provas em comum ao pedido de cassação da chapa. Por isso, também ficou sob a responsabilidade de Maria Thereza. Mas somente até por mais três semanas depois, quando o mandato da ministra acabava, deixando os processos de sua competência nas mãos de Herman Benjamin.
Se Benjamin apresentava-se, pelas análises e editoriais, como contrário à separação das investigações, logo que assumiu os processos de Maria Thereza, o corregedor-geral deixou escapar que ainda era cedo para avaliar se as contas do atual presidente poderiam ser julgadas separadamente das de Dilma.
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“Primeiro tenho que investigar os fatos. Se os fatos e provas levarem a uma conclusão que eventualmente venha a refletir na lisura do pleito, aí temos que avaliar como esse juízo acerca do pleito será aplicado. Se será aplicado para a chapa ou individualmente”, disse, no dia 31 de agosto.
E é no curso dessa “investigação dos fatos e provas” que novos fatores entraram em cena.
A primeira perícia acatada por Maria Thereza envolvia ouvir depoimentos de delatores da Operação Lava Jato, como o presidente da UTC, Ricardo Pessoa, o executivo da Setal Óleo e Gás, Augusto Mendonça, o ex-gerente da Petrobras Pedro Barusco, o lobista Zwi Skornicki, em fatos relacionados ao PT, e o ex-consultor da Toyo, Julio Camargo, o ex-dirigente da Camargo Corrêa, Eduardo Leite, e os lobistas Hamylton Padilha Jr e Fernando Soares, em fatos relacionados ao PMDB.
A ministra também aceitou o compartilhamento de provas da Lava Jato de Sérgio Moro com a Corte e perícias nas empresas Focal Confecção e Comunicação Visual Ltda., Gráfica VTPB Ltda., Editora Atitude, Red Seg Gráfica e Editora e Focal Confecção e Comunicação Visual Ltda. Naquela decisão, de abril de 2016, Maria Thereza já negava a Michel Temer a separação das investigações.
O prazo para a entrega do laudo, contado desde 15 de maio, era de 90 dias. Mas o documento de mais de 200 páginas foi disponibilizado nesta semana, passados cinco meses, e traz incriminações predominantemente às contas de Dilma Rousseff, e acrescentando o nome de Temer apenas em poucas menções dos auditores à chapa da candidatura à vice de 2014. Em breve comparação, enquanto que o nome de Michel Temer é repetido 26 vezes nas 220 páginas, o de Dilma Rousseff aparece 380 vezes [leia abaixo].
Mas até este resultado, frentes de investigações foram modificadas desde as solicitações de Maria Thereza. Foram aderidas às oitivas a esposa do marqueteiro de campanhas do PT, Mônica Moura, o ex-assessor de Dilma Giles Azevedo, um dos supostos operadores Claudio Augusto Mente, nome ligado ao ex-tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, entre outros.
O resultado obtido com as informações prestadas ao TSE foram, aos poucos, o afastamento do nome de Temer das acusações, isolando a campanha de Dilma Rousseff como a suposta principal receptora dos recursos investigados na Operação Lava Jato, conforme já auto-denunciam os caminhos traçados por Sergio Moro nas apurações.
Neste domingo (16), o Globo noticiava que a investigação do TSE “acha gasto de R$ 431 mil com entrevista na campanha de Dilma”. A manchete foi tirada de trecho de depoimento de Otávio de Azevedo Marques, então presidente do grupo Andrade Gutierrez, levando a Justiça a concluir que o dinheiro de empresas investigadas por corrupção abasteceu o caixa das campanhas da ex-presidente.
Inúmeros exemplos de supostos usos e benefícios pelos fundos de campanha de Dilma foram citados na reportagem, com base naquele relatório divulgado só agora pelos auditores do TSE. Apesar de as três gráficas (Red Seg, Focal e VTPB) serem responsáveis, juntas, por 15% dos gastos declaradas pela chapa do PT e PMDB à Presidência de 2014, Temer só consta em um dos exemplos levantados pelos auditores, de ter recebido R$ 204 mil para a organização de um comício na quadra da Portela, no Rio de Janeiro.
A estratégia iniciada em abril deste ano por Gilmar Mendes junto ao TSE trouxe efeitos. Passados seis meses, a defesa do atual presidente Michel Temer nas investigações do Tribunal não é sequer solicitada posicionamento para o “outro lado” das reportagens, cabendo apenas aos advogados de Dilma este papel.
E se em junho deste ano, Gilmar Mendes pretendia concluir até setembro o processo de cassação da chapa Dilma e Temer, por fraude e abuso de poder econômico na disputa eleitoral de 2014, quando admitia que estava trabalhando “na instrução e na perícia” do processo, ainda que não pertencente a ele a relatoria dos processos, o projeto de afastar definitivamente o atual presidente das incriminações mostra ter prioridade na agenda do Tribunal.
“O futuro a Deus pertence. Vamos aguardar. Nem sei se haverá julgamento este ano. Primeiro é preciso julgar para depois condenar, como diz o samba. Então não sabemos se haverá condenação. Em suma, nós temos um processo todo peculiar. A figura central deste processo saiu com o impeachment. Tudo isso dá uma nova configuração a este processo, que terá de ser verificado”, disse Gilmar no último mês.
“De vez em quando, vamos olhar a pauta do TSE. Se esse tema se colocar no futuro, vamos nos preocupar com isso. Mas não vou dar opinião sobre esse quadro institucional. Acho que o Brasil voltou ao quadro de normalidade. Estamos respirando normalmente e tentando trazer o país para o caminho da normalidade”, posicionou-se o presidente do TSE.