Menino bom é menino morto!
Marcel Sanchez, Pragmatismo Político
“Quando estilos que serviram ao progressismo se transformam em ninho do conservadorismo.”
Eis aí a atitude do rock, do glamour badass e a celebrização de atos incontinentes de rebeldia, deturpação de valores e aliciação de verdades sociais.
Esta atitude que, outrora, serviu de apoio a uma nobre evolução de conceitos sociais, hoje vem somando voz aos campos mais conservadores da sociedade e apoiando o senso comum a respeito de questões que exigem muita reflexão, como a pena de morte ou a redução da maioridade penal, por exemplo.
Seria necessário que se redigissem muitas laudas para discorrer aqui sobre toda a filosofia (de suma importância para a renovação da dinâmica social) e todo o pragmatismo da questão da redução da maioridade, mas vamos nos ater a alguns poucos pontos e, quem sabe, nos aprofundar em outra situação.
A verdade é que todos nós somos um pouco ruins, um pouco vingativos, um pouco falsos, e por fim, bastante defeituosos … Mas faz-se mister que se proponha desde já:
1 – Um mínimo de controle de nossa própria hipocrisia e conservadorismo descontrolado;
2 – Que não se espere do estado que se comporte como um ser humano;
3 – Que não se confunda o instrumento de ajuste social chamado “justiça”, com o sentimento e anseio mais primitivo chamado vingança.
Já de start lanço uma inconveniente verdade à minha própria argumentação: Se um dia eu chegar em casa e ver alguém pondo em risco direto a vida de um ente querido, se puder, faço o que for necessário para cessar o ato danoso iminente. E sim, se alguém atingisse de forma grave um ente querido meu, a minha primeira reação seria um inigualável desejo de vingança, de causar a ele o mesmo sofrimento.
Fica aqui registrado, somos todos humanos e ninguém pode negar a ninguém o direito sê-lo em sua mais profunda condição de primitivismo.
O que é preciso é que se revele aos olhos de uma população enfurecida que as soluções quem vêm sendo alardeadas são meros paliativos da frustração social, ou seja, sequer visam quaisquer tipo de solução, mas apenas a calmaria de ânimos.
Todo bom estudioso sabe bem que a redução da maioridade penal por si nunca chegou a reduzir a violência, o que reduz a violência é a velha noção de que o estado deve fornecer saúde, segurança, educação, comida e consumo pertinente a realidade de dignidade a qual o ser humano estiver inserido.
Os argumentos já começam mal quando vêm dizer que isto é utópico.
Ora, é ainda utópico, em primeiro lugar, porque ainda se pensa mais em punir o menor infrator do que em educar o “ainda não infrator”. Se a mesma pressão pública que é feita por leis mais severas foi feita pelas melhores condições de escolarização e pelo apoio à classe dos professores, acreditem meus senhores, a realidade já seria outra. Mas sempre insistem em cortar as pontas da planta, falam sobre a raiz, mas só exigem o corte da ponta.
Mora exatamente aí o primeiro grande ponto da hipocrisia/ignorância, falar tanto sobre a raiz mas pressionar APENAS pelo corte das pontas.
Mas sejamos sóbrios, há um argumento dos que são a favor da redução que está mais do que correto e precisa ser levado em completa consideração: Não dá tempo de simplesmente esperar que toda essa reformulação do sistema aconteça enquanto estes jovens cometem crimes todos os dias.
Está certo, mais do que certo.
Mas a redução da maioridade resolve isso? Deixo a todos os leitores a missão: pesquisem e encontrem em quantos lugares a diminuição da maioridade EFETIVAMENTE diminuiu a quantidade de crimes.
Não seria melhor então que a pressão social fosse para a discussão e revisão racional do Estatuto da Criança e do Adolescente, ao invés de simplesmente imputar a mesma pena que já não funciona nem aos mais velhos?
Se toda esta pressão social fosse então, por medidas sócio educativas de melhor qualidade (entenda-se aqui que mais severas não necessariamente sugerem melhor qualidade), acompanhamento de maior preparo ao menor “delinquente”, com certeza haveria muito, mas muito menos reincidência.
“Mas não tem que ter reincidência, tem quer nunca cometer o crime“. Correto, importante entender então que a pessoas que cometem o crime não o fazem pelo tempo de cadeia que pegam. A grande maioria enxerga no crime, devido a todo o resultado social, a maneira mais justa de se viver.
Sim, meus senhores, a maneira mais justa. Afinal, a justiça é um bem abstrato e impossível de ser alcançado ou resumido a um rol taxativo. Se concordo com a noção de justiça deles? OBVIAMENTE que não, mas entender isso não me faz um apoiador do crime, me faz alguém que, acredito eu, está um passo mais próximo de conhecer o “inimigo” e assim poder “combatê-lo” com maior eficácia.
Importante frisar que, salvo algumas exceções amplamente difundidas de “sociopatas” apresentados em jornais das seis da tarde, ninguém que passar nem um ano na cadeia.
O começo do combate ao crime não se dá com o quanto a pena será extensa, mas sim com a quase certeza de que será pego.
Capacitem a polícia, aumentem urgentemente o número de policiais, pague-os ao mínimo de forma decente e execre das corporações todos os corruptos. Mas é necessário não confundir vários despreparos que são culpa do estado com corrupção! Aos mal preparados, uma nova chance para que sejam guardiões da nossa ordem.
Também não vou me ater aqui, por mais urgente que seja, ao tema da desmilitarização da polícia.
Ah, aí sim caros leitores, com a certeza (ou quase) de quaisquer tipo de punição, de AO MENOS SER LEVADO E FICHADO NUMA DELEGACIA, ainda que numa primeira instância por infelicidade não aconteça nada, garanto que os índices diminuiriam desesperadamente.
Importante frisar aqui, ainda, que isso deve acontecer em perfeita harmonia com a revisão do nosso caráter punitivo para que haja efetividade e não vingança.
Mas cabe agora voltar ao título da matéria: e aquele vocalista famoso daquela banda de rock que você ouve sempre… quando ele comete crimes, você se manifesta incessantemente em redes sociais pelo menos para que ele seja julgado e condenado com penas realmente severas?
Hum…. sei…
Aquela banda que você gosta, que compra carregamentos de drogas daquele menino com uma arma na mão, que todos sabemos, é laranja dos poderosos, já acusou ela de “cúmplice” hoje?
Entra aí todo o falso moralismo, especialmente quando o alvo é você e os que você admira:
“Ah, mas eu só compro do morro porque o estado não legaliza.”
“Ah, mas eu só dirijo bêbado porque o estado não me paga o suficiente pra eu pegar táxi ou correr o risco de pegar ônibus de madrugada.”
Então eu agora te digo:
“Ah, mas eu só sou assaltante e assassino porque o estado não me deu infraestrutura e dignidade para ser outra coisa.”
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Quem será mais criminoso, o homem ou jovem que cresce no meio de um esquema de violência que nasce e morre ao lado da sua janela, ou um de nós, que também temos vidas muito difíceis, mas que mesmo assim superamos, crescemos e insistimos em dirigir bêbados por aí, pondo a vida do próximo em risco evidente?
Porque é que o empresário bêbado causa tanto assunto, mas não causa verdadeira pressão social?
Como disse um dia José Rainha: “Aos ricos, o favor da lei, aos pobres, o rigor da lei.”… mas sempre completo: à classe média baixa, o quase abandono, o salve-se quem puder.