Crime fardado: Assaltado pela polícia
Publicado em 28 Abr, 2011 às 15h52
Transcrevo relato de colega publicado originalmente no blog Atira Diária
Na madrugada deste dia 23 de abril de 2011, por volta de uma e meia da manhã, ao retornar de carro do meu trabalho, na Av. Brasil, fui seguido por uma viatura da polícia militar. Estava tranqüilo, pois a documentação estava em dia, minha habilitação na carteira e não havia ingerido bebida alcoólica. A viatura, que estava atrás de mim fez sinal com farol e eu encostei. Senti um frio na barriga.
Um de cada lado, eles surgiram me pedindo para sair do veículo, documentos e habilitação. A abordagem num tom ameaçador de quem está acostumado a ser violento foi seu cartão de visita. Desci do carro com a carteira na mão e entreguei ao primeiro policial. Logo vieram as perguntas: “Ta indo pra onde e tava fazendo o que?” Enquanto isso o segundo me pediu para abrir o porta-malas e, ao visualizar meu violão perguntou: “É músico?” Respondi que sim e a abordagem continuou. Ao perceberem que a documentação estava em dia, o primeiro olhou com atenção a placa do carro e, por esta ser de outro estado – Florianópolis – ele começou num estilo sarcástico de terrorista: “Ih rapaz, placa de fora não pode rodar no Rio, você não viu no jornal? O governador disse que isso é ilegal. Multa de R$1.200,00, apreensão do veículo e perda de 7 pontos na carteira, infração gravíssima”. Enquanto ele falava isso, o segundo foi na viatura e trouxe um jornal velho, e me mostrou uma reportagem de roda-pé falando alguma coisa sobre “falsidade ideológica”, não sei bem. Eu acabei de tirar minha habilitação, entendo de legislação e sei o que é infração gravíssima e isso não era uma.
Minha primeira reação foi: “ok, não sei do que estão falando, mas tenho certeza de que não tenho que me preocupar, já que minha mãe tem residência em Florianópolis e não caracteriza falsidade ideológica, afinal, o carro é dela” e disse: “Tudo bem, podem levar o carro, só me deixa fazer um telefonema pra minha mãe e avisar o que está acontecendo.” O segundo disse: “Que isso rapaz, vai acordar sua mãe? Olha só, a gente já falou com o tenente e ele disse que te libera, mas vai ter que fazer um acerto”
Nessa hora eu temi pelo meu dinheiro.
O primeiro pegou o telefone e fingiu (merecia um prêmio) um diálogo com o tenente. Só esqueceu de esconder o visor do seu “smart fone”, que estava na página de ‘agenda’, deixando claro que ele não estava falando com ninguém. Seu monólogo ao celular foi esse: “Isso tenente, confirmado placa de Florianópolis… ok, o mesmo está disposto a colaborar… quanto? Cinco zero zero? Ok Tenente, vou falar com ele…” virando-se para mim com aquele ar de superioridade “ Olha rapaz, o tenente falou que por R$500,00 te libera” e o segundo ainda completou: “ É que agora envolveu mais gente, tem o escrivão da delegacia também”… o ESCRIVÃO???
Comecei a argumentar: “Meu senhor (aprendi que se deve tratar polícia assim) eu sou músico, estou voltando do trabalho, tenho que pagar meu aluguel e contas para dois filhos, não tenho esse dinheiro…” o segundo: “Ué, mas e seu cachê?”
Nessa hora senti raiva.
No momento em que travávamos esse diálogo outro carro parou na nossa frente e o motorista avisou: “Ó, tem uns motociclistas armados ali atrás, eles deram meia volta quando viram a viatura!”
Achei que iriam me deixar para ir atrás dos bandidos. Não foram. E ainda me disseram isso: “Ta vendo? São esses aí que a gente quer atrasar! Com você a gente só quer ajudar, agora, se você quiser que a gente faça nosso serviço direito a gente faz…” quando ele terminou eu respondi imediatamente: “Tudo bem, pode rebocar” Eu sabia que eles não iriam fazer isso. O primeiro fingiu falar ao telefone de novo e me veio com essa “Olha, o tenente falou que te libera por um cinco zero”. Nessa altura eu já estava completamente transtornado e falei mais uma vez “Tudo bem, pode rebocar o carro”. Nisso, o segundo levantou a metralhadora e me falou “A gente não vai rebocar seu carro”
Nessa hora temi pela minha vida.
O primeiro perguntou quanto eu tinha pra ‘perder’, eu respondi que pra perder não tinha nada, pois o dinheiro que eu tinha já estava comprometido com minhas contas. Ele me olhou sério e perguntou mais uma vez quanto eu ia dar pra eles.
Dei metade do meu cachê. Cem reais. Com dor no coração, após três horas de show, num sábado à noite, longe dos meus filhos, da minha casa, fazendo a alegria de pessoas que eu não conheço, vi metade do meu ganho ir parar nas mãos de quem deveria me proteger.
Não vou ficar fazendo reflexões sobre o sistema, corrupção ou outros absurdos. Estou apenas contando minha história e peço para que vocês reflitam. Fui assaltado pela polícia, na cara de pau, sem chance de defesa, covardemente e pior, eles sairão impunes.
No dia seguinte, domingo de páscoa, eu fui numa delegacia de Niterói, onde moro, prestar queixa. O rapaz que me atendeu ouviu minha história e disse: “Olha rapaz, vou encaminhar sua denúncia para a unidade onde o fato ocorreu, provavelmente eles vão te chamar pra depor. Mas não posso te garantir que não haverá represália”. É, isso me deixou bem tranqüilo. Não registrei a queixa. Não sei o nome dos policiais nem o número da viatura, por isso, não posso usar o disk-denúncia. Aliás, que idéia a minha, denunciar polícia pra polícia.
Resolvi escrever essa carta para denunciar o ocorrido a quem eles temem: A Imprensa. Pode ser que não dê em nada, mas só o fato de outras pessoas saberem disso, já me sinto um pouco menos injustiçado.