O empresário milionário por trás da Reforma Trabalhista no Senado
A história do empresário milionário que fez a Reforma Trabalhista passar irretocada na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado Federal
Helena Borges, The Intercept
Um representante patronal: empresário dono de companhias em diferentes áreas, com um patrimônio estimado em aproximadamente R$400 milhões, acionista com investimentos em diversos bancos dentro e fora do país. O senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) é o presidente da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), onde foi concluída ontem a primeira fase de discussões e análises da Reforma Trabalhista no Senado. Sob seu comando, a Comissão levou as discussões a toque de caixa, a leitura de relatórios foi cortada e todas as possíveis emendas ao projeto de lei foram vetadas. Agora, ele se volta para o plenário, para onde retornará também a proposta da reforma, após passar pelas comissões de Assuntos Sociais (CAS) e de Constituição e Justiça (CCJ). Entender quem é Jereissati é entender as possibilidades que o futuro da reforma reserva aos direitos dos trabalhadores brasileiros.
O sobrenome incomum é de origem sírio-libanesa e se tornou sinônimo de riqueza, sendo homônimo da holding familiar. Tasso nasceu em dezembro de 1948 em Fortaleza e foi para o Rio de Janeiro estudar administração na Fundação Getúlio Vargas, berço da escola neoliberal no Brasil. Depois de formado, voltou para Fortaleza, onde presidiu o Centro Industrial do Ceará (CIC) no início da década de 80. O Centro funcionava como pólo de convergência de industriais e empreendedores, onde eram organizados fóruns de debates das questões econômicas, sociais e políticas da região e do país.
Foi no CIC que surgiu o convite do então governador do Ceará, Gonzaga Mota, para entrar na política, em 1985. Inicialmente vinculado ao PMDB, pouco após a criação do PSDB, em 88, ele migrou para o partido que hoje preside pela terceira vez. Junto a ele, filiou-se também Ciro Gomes, seu colega desde o início na política, que após anos afastado agora se reaproxima e inclusive defende o nome de Jereissati para possíveis eleições indiretas.
Os interesses das elites produtivas continuam sendo defendidos por ele até hoje, principalmente na Comissão do Senado que preside, que tem entre suas missões emitir pareceres sobre a política econômica nacional, tributos, e até mesmo a escolha de membros importantes da equipe econômica do governo, como os Ministros do Tribunal de Contas da União, o presidente e os diretores do Banco Central.
Tucanato
Jereissati é da velha-guarda do PSDB. Um nome mais discreto que os de Fernando Henrique Cardoso e José Serra, mas não necessariamente menos poderoso. Apesar de ter sido cotado inúmeras vezes para a candidatura à Presidência do país, se limitou a presidir o partido e a operar nos bastidores.
Eleito presidente do PSDB pela primeira vez em 1991, cargo que manteve até 1993, convidou para sua equipe a economista (e agora também advogada) Elena Landau. Após a eleição de Fernando Henrique Cardoso em 1994, na qual Jereissati trabalhou arduamente, Landau se tornou diretora de Desestatização do BNDES. Ela comandou as privatizações federais no governo Fernando Henrique Cardoso de 1993 a 1996.
Em 2011, após uma “frustração” da economista com a política — “ficava frustrada a cada eleição quando as privatizações não eram defendidas”, afirmou ela em entrevista ao jornal Valor Econômico —, Jereissati a procurou novamente para que eles realizassem o retorno de nomes ligados à equipe de FHC e do Plano Real após três derrotas consecutivas em eleições presidenciais (2002, 2006 e 2010). Tasso pode não ser o nome que encabeça as chapas de eleição do PSDB, mas é ele quem faz a ponte com o mercado financeiro para recrutar a equipe econômica.
Negócios em família
Enquanto isso, seu irmão Carlos, dois anos mais velho, foi enviado para estudar economia na Mackenzie, em São Paulo. Lá fez raízes e começou criar em 1966 um império no mercado de shopping centers que hoje se chama Iguatemi: são 17 unidades distribuídas pelo país. Seu filho, que também se chama Carlos, é hoje o presidente da empresa e deu entrevistas no início do ano deixando claro que, segundo seus interesses, a Reforma Trabalhista seria a mais urgente.
É importante saber quem é o irmão de Tasso, principalmente porque grande parte de sua fortuna veio da privatização das teles — um projeto icônico do governo de FHC que Tasso ajudou a eleger. Carlos fundou um consórcio com a Andrade Gutierrez (hoje investigada na Lava Jato) e a Inepar (hoje em recuperação judicial) que, apesar de não ter nenhuma empresa familiarizada com o setor de telecomunicações, recebeu a concessão da Tele Norte Leste em 1998. Sob seu comando, a Tele Norte Leste tornou-se o que atualmente é a empresa de telefonia móvel Oi.
O próprio Tasso possui empresas de comunicação — duas emissoras de televisão e oito emissoras de rádio, todas no Ceará. Ele declarou um patrimônio de R$389 milhões em sua última eleição, em 2014. Segundo um levantamento do jornal O Globo, no período em que ficou afastado da política, entre 2010 e 2014, sua fortuna cresceu em 512%. A decisão pela aposentadoria foi por ter perdido a eleição ao Senado, fato que foi indiretamente comemorado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula. “Agradeço de coração a eleição dos senadores que vocês elegeram e me fizeram um favor tremendo”, disse o ex-presidente e desafeto de Jereissati em comício em Caucaia, a 50 km de Fortaleza.
Ao se retirar da política, em 2010, o cearense ainda atacou a presidente eleita Dilma Rousseff: “ela não tem a menor condição de governo e nem psicológica”.
Doações milionárias
Sua campanha de retorno, em 2014, contou com doações generosas da Contax-Mobitel S.A, de R$1 milhão. A Contax faz parte do Grupo Jereissati Participações SA. É claro que Tasso não negou a ajuda de outros integrantes do ranking de ricaços brasileiros. Recebeu R$150 mil, por exemplo, doados diretamente por Alexandre Grendene Bartelle, o 20º maior bilionário do país, dono da empresa Grendene.
Também consta na lista a Solar, uma das 20 maiores fabricantes de Coca-Cola do mundo e a primeira com acionista brasileiro: a Calila Participações, do Grupo Jereissati. Foi da Solar que saiu a maior doação de campanha para Jereissati: R$1,5 milhão. A empresa tem 12 mil empregados, que seu site chama de “colaboradores”, que trabalham em 13 fábricas e 36 centros de distribuição.
Defensor da Reforma Trabalhista — que está sendo relatada por seu colega de partido, o senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES) —, o político e empresário Jereissati pressionou para que o projeto fosse votado logo e com o mínimo de mudanças o possível. Ou seja, sem emendas que protejam pelo menos em parte os direitos dos trabalhadores. No dia 30 de maio, ele deu o relatório da reforma como lido durante uma sessão conturbada que impediu a conclusão da leitura – o que prejudica o debate, já que o texto não foi completamente exposto. Na terça, dia 6 de junho, a Comissão concluiu a votação sem alterações. Ela segue agora para apreciação das Comissões de Assuntos Sociais e de Constituição, Justiça e Cidadania.
A missão de Tasso continua sendo aprovar a reforma, agora no plenário, o mais rápido possível e com o menor número de emendas, apesar da reprovação absoluta por parte da população, retratada inclusive em pesquisa popular da própria casa. No entanto, segundo Jereissati, a reforma segue sendo o caminho, e “o Brasil depende de que nós continuemos a trabalhar e dar, ao processo de reformas, seguimento”. Resta deixar claro de que segmento do Brasil que ele fala: dos 172 mil que possuem mais de R$1 milhão em suas contas, como ele, ou dos 207 milhões de brasileiros restantes.