Verissimo: espero que poupem o país da imagem do Lula com correntes nos pés
Em novo texto, escritor Luis Fernando Verissimo comenta a condenação de Lula e discorre sobre texto publicado pelo The New York Times que antecipava a incredulidade na imparcialidade dos desembargadores do TRF-4
por Luis Fernando Verissimo, Globo
Mark Weisbrot dirige o Centro de Pesquisas Econômicas e Políticas, em Washington. Ele escreveu um artigo para o “New York Times” de anteontem sobre o julgamento de Lula, com o título “A democracia brasileira é empurrada para o abismo”. Weisbrot não acreditava na imparcialidade da corte e, no seu artigo, lembra que o juiz que presidiria o painel de apelação já tinha chamado a sentença original do Sergio Moro de “tecnicamente irreparável”, e sua chefe de gabinete já publicara no seu Facebook uma petição pela prisão do ex-presidente, antes de saber o resultado da apelação. O abismo de que escreve Weisbrot é uma queda no passado. Segundo ele, a democracia no Brasil nunca esteve tão frágil, desde o fim do regime militar.
Weisbrot cita dois exemplos do que chama de evidente parcialidade de Moro, quando este autorizou a condução coercitiva do Lula — que se oferecera para depor voluntariamente — só pelo espetáculo midiático, e depois a publicação da gravação de uma conversa telefônica entre Lula e a presidente Dilma, proibida por lei. Quanto às acusações que resultaram na condenação de Lula a nove anos de prisão, tecnicamente irreparáveis segundo o presidente do painel de apelação, Weisbrot diz que elas nunca seriam levadas a sério, por exemplo, no sistema judicial americano. Nos Estados Unidos, o julgamento em curso do Lula poderia ser um exemplo do que eles chamam de kangaroo court, um tribunal irregular reunido unicamente para condenar, e danem-se as provas.
Não sei de onde o mr. Weisbrot tira sua informação, e qual é o apito ideológico que ele toca; mas, fora alguns exageros como o abismo que vai nos engolir, o Brasil que ele enxerga lá de Washington é esse mesmo. Ele identifica a deposição da Dilma como o primeiro ato da exceção que vivemos agora, cujo objetivo indiscutível é barrar o futuro político do Lula e do PT.
Enfim, no momento em que escrevo, ninguém sabe o que aconteceu ontem — pra que lado pulou o canguru — e muito menos o que vai acontecer amanhã. Só espero que poupem o país da imagem do Lula arrastando correntes com os pés.